terça-feira, janeiro 10, 2006

Viagem

Naquela manhã três homens vestidos de preto pegaram o trem para a cidade grande.
Tudo igual há outros dias, a não ser pelo fato que esse trem não ia chegar ao seu destino, não do mesmo jeito que saiu.
Os três homens não se sentaram no mesmo vagão.O mais alto que tinha uma cicatriz em sua face, uma marca de seu passado em bares, estava no vagão dois.
O mais baixo, que era loiro com grandes cabelos despenteados sobre seu ombro e não gostava da presença do da cicatriz ficava no vagão um.
O terceiro homem unia os dois como um chefe impiedoso que decidia o rumo de suas vidas.Suas características físicas eram fortes e seu rosto se destacava por ser duro, um rosto marcado pela vida, talhado pelo sofrimento.
Este ficava no vagão três, olhava pela janela, a bela e bucólica paisagem.
Sentindo a mão do destino pesar sobre seu ombro, pegou um charuto de sua camisa xadrez novo, acendeu calmamente aquele que foi um presente de seu mais fiel companheiro.
O cicatriz não sentou na janela, mas também não se preocupava em olhar a paisagem. Seus pensamentos voavam por terras e combates que o tinha deixado marcado pelo resto da vida.
Sentiu sua mão acariciando o próprio rosto, aquela cicatriz o lembrava do motivo daquela viajem. Era a marca de seu extremo desprezo pela vida.
Fechou os olhos e respirou profundamente sentindo o cheiro de mato molhado com o inconfundível odor do trem.
Quando o loiro se sentou em seu lugar, o acento do lado estava vazio, se sentiu aliviado, pois, não gostava quando alguma pessoa ficava tentando conversar ou dormindo ao seu lado.
Queria se sentir sozinho queria que o mundo acabasse ali mesmo, com ele olhando aquelas colinas e riachos.
Sentia seus olhos pesados, um sono mortal se aproximava, tentou pensar em outra coisa, na mulher que deixou em casa, nos seus dias felizes que havia passado ao seu lado.
Muito tempo se passou depois que ele morreu para a vida de romances, seu coração agora era uma pedra que pesava morta em seu peito.
O chefe apagou o charuto espremendo o em sua própria mão, sem demonstrar dor, levantou, pediu licença a senhora que cochilava ao seu lado.
Caminhou lentamente pensando no que estava fazendo ali, e de como teria sido diferente se não tivesse fugido de suas responsabilidades.
Parou olhando fixamente para o loiro que o esperava em pé com um leve sorriso irônico.
Sabia que a cicatriz estava com o mesmo sorriso apesar de estar de costas para ele.
Era o sorriso da vitória amarga, um desfecho inevitável.
Os tiros ecoaram pelo vagão.
O chefe estava morto, perfurado pelas balas da vingança tardia.
O loiro volta para seu lugar, olhando a paisagem que corre em silenciosa cumplicidade.
A cicatriz olha pela ultima vez para o corpo de seu chefe. Coloca a arma no coldre e volta para seu lugar, se sentindo diferente, sentindo que sua cicatriz não pesava tanto.
O trem chega a seu destino e os homens que foram parceiros, um dia, se separam sem nenhuma palavra.
Para sempre.

Kvasir
06/05/04

3 comentários:

Anônimo disse...

Otimo conto! gostei mais do primeiro
bjus

Tyr Quentalë disse...

Oi minha cara Irmã!
Este conto mostra a natureza que encontramos em um meio mafioso. O que torna interessante a leitura, o fato dos três irem em vagões separados, pensando nos pormenores de suas vidas antes daquilo que os tornaram frios e insensíveis, trouxe um desfecho fabuloso. Uma Vinganças.. Um ajuste de contas... Os outros dois Apenas encontraram suas devidas liberdades livrando-se de um fardo que os prendia. Está de parabéns!

Anônimo disse...

Vc consegue elaborar várias situações para descrever a realidade humana como ela realmente é !!